|
“Até aqui, foi assumido que todo o nosso conhecimento deve conformar-se aos objetos. Mas todas as nossas tentativas de estender o nosso conhecimento de objetos pelo estabelecer de qualquer coisa a priori a seu respeito, por meios de conceitos, acabaram, nesta suposição, por falhar. Temos pois, por tentativas, que ver se temos ou não mais sucesso nas tarefas da metafísica, se supusermos que os objetos devem corresponder ao nosso conhecimento.”
Tal como Copérnico revolucionou a astronomia ao mudar o ponto de vista, a filosofia crítica de Kant pergunta quais as condições a priori para que o nosso conhecimento do mundo se possa concretizar.
O idealismo transcendental descreve este método de procurar as condições da possibilidade do nosso conhecimento do mundo. Mas esse idealismo transcendental de Kant deverá ser distinguido de sistemas idealistas, como os de Berkeley. Enquanto Kant acha que os fenômenos dependem das condições da sensibilidade, espaço e tempo, esta tese não é equivalente à dependência-mental no sentido do idealismo de Berkeley.
Para Berkeley, uma coisa é um objeto apenas se puder ser percepcionada. Para Kant, a percepção não é o critério da existência dos objetos. Antes, as condições de sensibilidade - espaço e tempo - oferecem as "condições epistémicas", para usar a frase de Henry Allison, requeridas para que conheçamos objetos no mundo dos fenômenos. Kant tinha querido discutir os sistemas metafísicos mas descobriu "o escândalo da filosofia": não se pode definir os termos correto para um sistema metafísico até que se defina o campo, e não se pode definir o campo até que se tenha definido o limite do campo da física - física, no sentido de discussão do mundo perceptível.
Kant afirma, em síntese, que não somos capazes de conhecer inteiramente os objetivos reais e que o nosso conhecimento sobre os objetos reais é apenas fruto do que somos capazes de pensar sobre eles.
Filosofia Moral
Immanuel Kant desenvolve a filosofia moral em três obras: Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785), Crítica da Razão Prática (1788) e Crítica do Julgamento (1790).
Nesta área, Kant é provavelmente mais bem conhecido pela teoria sobre uma obrigação moral única e geral, que explica todas as outras obrigações morais que temos: o imperativo categórico.
|
“Age de tal modo que a máxima da tua ação se possa tornar princípio de uma legislação universal.”
|
|
O imperativo categórico, em termos gerais, é uma obrigação incondicional, ou uma obrigação que temos independentemente da nossa vontade ou desejos (em contraste com o imperativo hipotético).
As nossas obrigações morais podem ser resultantes do imperativo categórico. O imperativo categórico pode ser formulado em três formas, que ele acreditava serem mais ou menos equivalentes (apesar de opinião contrária de muitos comentadores):
§ A primeira formulação (a fórmula da lei universal) diz: "Age somente em concordância com aquela máxima através da qual tu possas ao mesmo tempo querer que ela venha a se tornar uma lei universal".
§ A segunda fórmula (a fórmula da humanidade) diz: "Age por forma a que uses a humanidade, quer na tua pessoa como de qualquer outra, sempre ao mesmo tempo como fim, nunca meramente como meio".
§ A terceira fórmula (a fórmula da autonomia) é uma síntese das duas prévias. Diz que deveremos agir por forma a que possamos pensar de nós próprios como leis universais legislativas através das nossas máximas. Podemos pensar em nós como tais legisladores autônomos apenas se seguirmos as nossas próprias leis.
Kant e a Revolução Francesa
Em 1784, no seu ensaio "Uma resposta à questão: o que é o Iluminismo?", Kant visava vários grupos que tinham levado o racionalismo longe de mais: os metafísicos que pretendiam tudo compreender acerca de Deus e da imortalidade; os cientistas que presumiam nos seus resultados a mais profunda e exata descrição da natureza; os cépticos que diziam que a crença em Deus, na liberdade, e na imortalidade, eram irracionais.
Kant mantinha-se no entanto otimista, começando por ver na Revolução Francesa uma tentativa de instaurar o domínio da razão e da liberdade. Toda a Europa do Iluminismo contemplava então fascinada os acontecimentos revolucionários em França.
A Revolução francesa vai no entanto ser um marco de viragem, também na filosofia de Kant. Observando a evolução e as realizações práticas, Kant volta a refletir sobre a prometida razão e liberdade.
No plano religioso, em 1792, Kant, ao escrever a obra Der Sieg des guten Prinzips über das böse und die Gründung eines Reichs Gottes auf Erden (A vitória do princípio bom sobre o princípio mau e a constituição de um reino de Deus sobre a terra), afirma ainda cheio de otimismo: "A passagem gradual da fé eclesiástica ao domínio exclusivo da pura fé religiosa constitui a aproximação do reino de Deus".
Nessa obra, o "reino de Deus" anunciado nos Evangelhos recebia como que uma nova definição e uma nova presença: a Revolução podia apressar a passagem da fé eclesiástica à fé racional; onde chegasse a Revolução a "fé eclesiástica" seria superada e substituída pela "fé religiosa", ou seja, pela "mera fé racional."
Em 1795, no livro Das Ende aller Dinge ("O fim de todas as coisas"), a perspectiva é já completamente diferente. Kant toma agora em consideração a possibilidade de que, a par do fim natural de todas as coisas, se verifique também um fim contrário à natureza, perverso:
Se acontecesse um dia chegar o cristianismo a não ser mais digno de amor, então o pensamento dominante dos homens deveria tomar a forma de rejeição e de oposição contra ele; e o anticristo [...] inauguraria o seu regime, mesmo que breve, (baseado presumivelmente sobre o medo e o egoísmo). Em seguida, porém, visto que o cristianismo, embora destinado a ser a religião universal, de facto não teria sido ajudado pelo destino a sê-lo, poderia verificar-se, sob o aspecto moral, o fim (perverso) de todas as coisas.
Face à violência inaudita da Revolução Francesa, e ao novo tipo de autoritarismo que se firmava nas "Luzes" da razão, Kant vai também refletir acerca dos seus conceitos políticos.
Cronologia da vida de Kant
1724 - Kant nasce a 22 de abril.
1740 - Neste ano, Frederico II torna-se Rei da Prússia. Foi um rei que trouxe sinais de tolerância à Prússia, que era uma nação célebre pela disciplina militar. Trouxe iluministas (Voltaire, o mais famoso) para a corte e continuou a política de encorajamento à imigração que o pai tinha seguido.
1746 - Falecimento do pai de Kant. Kant deixou de ter sustento. Teria de encontrar trabalho como professor particular.
1748 - 1754 - Kant dá aulas a crianças em pequenas vilas das redondezas.
1755 - Publicação do Livro "História natural genérica e teoria dos céus". Kant consegue o título de Mestre e o direito a dar aulas na Universidade Alberto. Daria aulas como docente privado. Não pago pela Universidade mas pelos próprios alunos. Nesse ano, Kant foi influenciado pelo desastre que foi o Terremoto de 1755, em Lisboa/Portugal, em parte pelo resultado de tentar entender a enormidade do sismo e as consequências, publicou três textos distintos sobre o assunto.
1770 - Kant torna-se professor de Lógica e Metafísica na Universidade, após 14 anos como docente (pago pelos alunos). Kant lê por volta desta altura a obra de David Hume, que o terá despertado do seu "sono dogmático", como ele próprio disse.
1774 - Auge do movimento romântico chamado "Sturm-und-Drang". Herder publica "Também uma filosofia da História para educação da Humanidade".
1783 - Kant escreve um artigo intitulado "O que é o Iluminismo?" para a revista "Berlinischen Monatsschrift", como resposta a uma discussão na mesma. Um anônimo tinha escrito que a cerimônia do casamento já não se conformava ao espírito dos tempos do iluminismo. Um pastor perguntou na resposta, que era então o iluminismo. Kant respondeu com o seu artigo.
1789 - Início da Revolução Francesa. Kant pronuncia-se inicialmente de forma favorável à Revolução, e sobretudo à secularização resultante, após o qual o Rei da Prússia Friedrich Wilhelm II proíbe Kant de se pronunciar sobre quaisquer temas religiosos.
1795 - Publicação do tratado "Para a paz eterna", na qual surge a perspectiva de um cidadão do mundo esclarecido.
Obras
Dissertação sobre a forma e os princípios do mundo sensível e inteligível (1770);
Prolegômenos para toda metafísica futura que se apresente como ciência (1783);
Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1784);
Fundamentos da metafísica da moral (1785);
Primeiros princípios metafísicos da ciência natural (1786);
A Religião dentro dos limites da mera razão (1793);
A Paz Perpetua (1795);
Doutrina do Direito (1796);
A Metafísica da Moral (1797);
Antropologia do ponto de vista pragmático (1798).
Prolegómenos a Toda a Metafísica Futura;
Referências
↑ Vanni Rovighi, Sofia, Introduzione allo studio di Kant, Roma, 1945, Core, Mori
↑ a b Crítica da razão pura, Martin Claret/Cassier, Ernst, Kants Leben und lehre, Berlin, 1921.
↑ KANT, I. Crítica da razão pura. 4ª ed. Prefácio à tradução portuguesa, introdução e notas: Alexandre Fradique MOURUJÃO. Tradução: Manuela Pinto dos SANTOS e Alexandre Fradique MOURUJÃO. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 30.
↑ Emmanuel Kant in Werke IV, coordenado por W. Weischedel, 1956, p. 777.
↑ Emmanuel Kant, Das Ende aller Dinge, cit. em Werke VI, coordenado por W. Weischedel, 1964, p. 190.
↑ Sidney Axinn, "Authority, and the French Revolution", Journal of the History of Ideas, Vol. 32, No. 3 (Jul. - Sep., 1971), pp. 423-432.
ALMEIDA, Aires (org.). Dicionário Escolar de Filosofia. [s.l.]: Plátano Editora, 2003.
HEIDEGGER, Martin. Kant und das Problem der Metaphysik. Bonn, 1929.
KANT, Immanuel. Crítica da faculdade do juízo. Tradução de Valério Rohden e António Marques. Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária, 1993.
Revista de Filosofia, Curitiba, v. 18 n. 21, p. 11-25, jul./dez. 2005.
Revista Lindaraja, Madrid, Anuario de la Sociedad Española de Literatura General y Comparada, n. 8, 1990, pags. 25-29, 1990.
PEREZ, D. O. Kant e o problema da significação. Curitiba: Editora Champagnat, 2008.
PEREZ, D. O. . Religión, Política y Medicina en Kant: El Conflicto de las Proposiciones. Cinta de Moebio. Revista de Epistemologia de Ciencias Sociales., v. 28, p. 91-103, 2007.
PEREZ, D. O. . Os significados dos conceitos de hospitalidade em Kant e a problemática do estrangeiro. Revista Philosophica (Chile), v. 31, p. 43-53, 2007. Também em Konvergencias, 2007, nro. 15.
TERUEL, P. J. Mente, cerebro y antropología en Kant. Madrid: Tecnos, 2008.
Compliação by Muriel
| | |